O lançamento do dardo é uma das provas mais antigas e visualmente impressionantes do atletismo. Requer uma combinação de velocidade, coordenação, força e precisão técnica para projectar uma lança o mais longe possível, com grande elegância e controlo.
Neste artigo, vamos explorar em profundidade a história do lançamento do dardo, as regras da prova, o equipamento utilizado, as fases técnicas, o treino específico, as lesões comuns, os recordes mundiais, os principais atletas da disciplina e o seu desenvolvimento em Portugal.
1. História do Lançamento do Dardo
O lançamento do dardo tem origens milenares. Era uma prática comum em sociedades antigas, tanto como forma de caça como em contextos militares. Na Grécia Antiga, era uma das disciplinas do péntatlo, nos Jogos Olímpicos originais.
Na era moderna, o lançamento do dardo foi incluído no programa olímpico em 1908 (homens). A prova feminina só foi introduzida em 1932, nos Jogos de Los Angeles.
Ao longo das décadas, o equipamento e a técnica evoluíram substancialmente, tornando o dardo uma das provas mais técnicas e exigentes do atletismo.
2. Objectivo e Regras da Prova
O objectivo da prova é lançar o dardo o mais longe possível, partindo de uma pista de impulso, e fazendo com que este caia dentro do setor de queda, sem infringir as regras técnicas.
Regras principais:
- O lançamento deve ser feito por cima do ombro ou do braço, sem movimentos circulares ou estilo “tipo disco”.
- O dardo deve tocar o solo com a ponta metálica.
- O atleta não pode pisar a linha de limite no final da pista (linha curva branca).
- O dardo deve cair dentro de um setor com 28,96 graus de abertura.
- Cada atleta tem entre 3 a 6 tentativas, dependendo da fase da competição.
3. O Dardo: Estrutura e Características
O dardo moderno é composto por:
- Ponta metálica: que deve ser a primeira parte a tocar o solo.
- Corpo (haste): geralmente em alumínio ou fibra de carbono.
- Empunhadura (grip): uma corda enrolada, colocada no centro de gravidade, onde o atleta segura o dardo.
Pesos regulamentares:
- Masculino: 800 g; comprimento: entre 2,60 m e 2,70 m
- Feminino: 600 g; comprimento: entre 2,20 m e 2,30 m
Existem variações mais leves para categorias juvenis e formação.
4. Zona de Lançamento
O lançamento do dardo é feito a partir de uma pista de impulso, semelhante à de corrida, com cerca de 30 a 36,5 metros de comprimento, terminando numa linha curva que marca o limite.
Setor de queda:
- Tem 28,96° de abertura
- É delimitado por duas linhas brancas que se prolongam desde a linha de limite
- A superfície deve ser plana, com relva ou terra batida
5. Fases Técnicas do Lançamento do Dardo
O lançamento do dardo envolve uma sequência de movimentos coordenados, onde cada fase influencia a eficácia da seguinte.
a) Corrida de aproximação
- Geralmente com 13 a 17 passadas
- A velocidade aumenta progressivamente
- O dardo é inicialmente transportado sobre o ombro com o braço relaxado
b) Cruzamento (cross step)
- As últimas 5 a 7 passadas são em “passadas cruzadas” (similar a um passo de dança)
- Permite posicionar o corpo lateralmente e preparar o movimento de rotação
c) Colocação do corpo
- O tronco gira ligeiramente para trás, com o braço do dardo esticado
- O centro de massa baixa, preparando a impulsão
d) Lançamento
- O pé de bloqueio (frontal) trava o movimento
- O tronco roda rapidamente enquanto o braço acelera o dardo
- A libertação deve ocorrer com o dardo acima da linha do ombro, a um ângulo ideal de 33° a 36°
e) Recuperação
- Após o lançamento, o atleta deve manter o equilíbrio e não pisar a linha curva branca
- Saídas descontroladas ou perdas de equilíbrio invalidam a tentativa
6. Fundamentos Técnicos-Chave
a) Ritmo da corrida
- Deve ser progressivo e fluido
- Um arranque demasiado rápido compromete a estabilidade do lançamento
b) Posição do corpo
- O alinhamento do ombro e anca é fundamental para gerar torque
- O braço do dardo deve permanecer estendido e relaxado até ao momento da impulsão
c) Ângulo de lançamento
- Determina a trajetória do dardo
- Um ângulo baixo compromete a distância; um ângulo alto perde velocidade horizontal
7. Biomecânica do Lançamento
O lançamento do dardo exige a conversão de energia cinética (velocidade da corrida) em energia elástica e angular (rotação e braço).
- A velocidade de libertação pode chegar a 30 m/s
- As forças nos ombros e cotovelos ultrapassam frequentemente os 1000 N
- O tempo de contacto no momento da impulsão é de apenas frações de segundo
8. Perfil do Lançador de Dardo
Os atletas de dardo têm um perfil físico e motor muito específico:
- Altura média-alta (1,75 m a 1,95 m)
- Corpo esguio, mas forte, com músculos longos e explosivos
- Mobilidade articular elevada, especialmente nos ombros e coluna torácica
- Coordenação motora fina
- Velocidade de sprint com controlo técnico
9. Treino Específico para Lançamento do Dardo
a) Técnica
- Trabalho por fases: corrida, cruzamento, impulsão, lançamento
- Lançamentos com elásticos, bolas, dardos leves
- Treino com vídeo para correção postural
b) Força
- Explosividade: saltos, arranques curtos
- Força funcional: halterofilismo adaptado (snatch, clean)
- Treino de core e estabilização da bacia
c) Mobilidade
- Ombros, escápulas, anca e coluna torácica
- Alongamentos dinâmicos e específicos
d) Psicologia
- Visualização do lançamento ideal
- Técnicas de concentração pré-competição
- Desenvolvimento de rotina técnica
10. Lesões Comuns
Devido à elevada carga no braço de lançamento e à rotação intensa, o dardo apresenta risco para várias lesões.
Lesões mais frequentes:
- Tendinites do manguito rotador
- Luxações do ombro
- Epicondilite (cotovelo do lançador)
- Lesões lombares
- Microlesões nas articulações dos joelhos e tornozelos
A prevenção passa por treino equilibrado, boa técnica, fisioterapia preventiva e períodos de descanso programado.
11. Recordes e Atletas de Destaque
Recordes Mundiais:
- Masculino: Jan Železný (Rep. Checa) – 98,48 m (1996)
- Feminino: Barbora Špotáková (Rep. Checa) – 72,28 m (2008)
Atletas Icónicos:
- Jan Železný: tricampeão olímpico, considerado o maior de sempre
- Barbora Špotáková: bicampeã olímpica
- Johannes Vetter (Alemanha): lançamentos acima dos 97 m nos últimos anos
- Kelsey-Lee Barber (Austrália): destaque no sector feminino atual
12. Lançamento do Dardo em Portugal
Portugal tem tradição moderada no lançamento do dardo, mas já revelou talentos promissores e atletas competitivos a nível ibérico e europeu.
Destaques nacionais:
- Sílvia Cruz: recordista nacional com 59,76 m, presença olímpica
- Leandro Ramos: promessa em ascensão, com marcas superiores a 80 metros
- Clube do Lançamento do Dardo (Benavente) e núcleos regionais têm trabalhado na formação de base
A Federação Portuguesa de Atletismo promove a modalidade em competições nacionais desde os escalões infantis até aos séniores.
13. Curiosidades
- O centro de gravidade do dardo foi reposicionado nos anos 80 para reduzir as distâncias exageradas que ameaçavam a segurança
- Antigamente, o dardo era feito em madeira; hoje utiliza materiais aerodinâmicos
- Atletas de heptatlo e decatlo também praticam dardo, mas com técnica geralmente menos refinada
- O som do lançamento perfeito é descrito como um “assobio” no ar
Conclusão
O lançamento do dardo é uma prova que combina precisão, força e elegância. Muito mais do que atirar uma lança ao acaso, é um movimento técnico e controlado, fruto de treino intensivo, domínio corporal e mentalidade competitiva.
Em Portugal, a modalidade está em crescimento, com jovens atletas a mostrarem que é possível competir ao mais alto nível, com técnica e paixão pela arte de lançar.