O salto com vara é uma das disciplinas mais técnicas, exigentes e visualmente impressionantes do atletismo. Consiste na transposição de uma barra horizontal com o auxílio de uma vara flexível, exigindo uma perfeita combinação de velocidade, força, coordenação, técnica e, acima de tudo, coragem.

Este artigo explora todos os aspectos fundamentais do salto com vara: a sua história, regras, fases técnicas, tipo de material usado, preparação física e mental, lesões mais comuns e os grandes nomes da disciplina — tanto internacionais como portugueses.


1. Breve História do Salto com Vara

O uso da vara para saltar obstáculos remonta à Antiguidade, onde era comum entre agricultores e militares atravessar rios ou valas com a ajuda de paus compridos. No entanto, como disciplina desportiva moderna, o salto com vara começou a ser praticado na Europa no século XIX.

O salto com vara foi incluído nos primeiros Jogos Olímpicos modernos em 1896 (apenas para homens). A versão feminina só foi oficialmente introduzida nos Jogos Olímpicos de Sydney 2000.

Com o passar dos anos, as técnicas foram evoluindo, assim como o material das varas, passando da madeira para o alumínio e, mais tarde, para a fibra de vidro e carbono — o que revolucionou a modalidade.


2. Objectivo e Regras da Prova

O objectivo do salto com vara é ultrapassar uma barra horizontal, colocada entre dois postes, utilizando uma vara flexível como instrumento de impulsão e elevação.

Regras principais:

  • O atleta corre com a vara, que deve ser colocada no caixote de encaixe (box) situado no solo, junto à zona de salto.
  • A impulsão é feita com um pé e o atleta projeta-se no ar com o auxílio da flexão da vara.
  • A tentativa é nula se o atleta:
    • Derrubar a barra
    • Falhar o encaixe da vara
    • Sair fora da zona válida
    • Soltar a vara de forma irregular

Cada atleta tem três tentativas por altura e vence quem ultrapassar a maior altura com o menor número de falhas.


3. Estrutura do Campo e Equipamento

a) Pista de corrida

  • Normalmente com 30 a 45 metros de comprimento
  • Deve permitir aceleração progressiva e máxima velocidade antes da impulsão

b) Caixote (box)

  • Estrutura metálica embutida no solo
  • Mede cerca de 1 metro de comprimento
  • Recebe a extremidade da vara e funciona como ponto de alavanca

c) Vara

  • Feita em fibra de vidro ou carbono
  • Varia em comprimento (4 a 5,2 m) e flexibilidade
  • Cada atleta escolhe varas diferentes consoante a sua altura, peso, velocidade e técnica

d) Barra e postes

  • A barra é feita de material leve (geralmente fibra de carbono) e assenta em suportes
  • Os postes são ajustáveis em altura

e) Colchão de queda

  • Amplo e espesso, para absorver o impacto da queda do atleta após o salto

Salto com Vara

4. As Fases Técnicas do Salto com Vara

O salto com vara é uma sequência altamente coordenada de ações. Cada fase influencia a seguinte, sendo necessário um treino rigoroso para dominar todas as etapas.

a) Corrida de aproximação

  • Realizada em alta velocidade (geralmente entre 16 e 20 passadas)
  • O objetivo é gerar energia cinética suficiente para transferir para a vara
  • A vara é transportada com a ponta voltada para baixo, de forma controlada

b) Encaixe da vara

  • A extremidade da vara é colocada no caixote
  • A impulsão inicia-se ao mesmo tempo que a vara começa a fletir
  • É crucial o timing da chamada (pé de impulsão no ponto certo) para evitar perdas de energia

c) Fase de inversão (take-off)

  • O atleta transfere o corpo da posição horizontal (corrida) para a vertical
  • O corpo sobe acompanhando a flexão da vara
  • Os braços permanecem esticados e o corpo começa a inverter

d) Extensão e elevação

  • Com a vara totalmente fletida, o atleta inicia a fase de extensão
  • Utiliza a energia acumulada na vara para elevar-se
  • O corpo passa para a vertical e depois inclina-se para trás

e) Passagem da barra

  • As ancas sobem, seguidas das pernas
  • O atleta deve evitar tocar na barra com os pés ou costas
  • Exige coordenação fina e noção espacial precisa

f) Aterragem

  • Feita de costas ou de lado, sobre o colchão
  • Requer controlo do corpo para evitar quedas descontroladas

5. Biomecânica do Salto com Vara

O salto com vara é uma das provas mais estudadas em termos biomecânicos. Envolve a transformação de energia horizontal em energia vertical, por meio da deformação e subsequente extensão da vara.

Componentes biomecânicos:

  • Velocidade de entrada: atinge-se frequentemente 30 km/h
  • Flexibilidade da vara: mais flexível = maior altura, mas exige maior técnica
  • Centro de massa: deve ser otimizado para minimizar o esforço

Os atletas de elite conseguem converter cerca de 95% da energia da corrida em altura, um feito técnico notável.


6. Perfil do Atleta de Salto com Vara

O saltador com vara é um atleta completo. Precisa de qualidades típicas de velocistas, ginastas e saltadores, incluindo:

  • Velocidade de sprint
  • Força explosiva
  • Coordenação e consciência corporal
  • Flexibilidade e mobilidade
  • Coragem e concentração elevada

Os homens costumam ter entre 1,75 m e 1,90 m; as mulheres entre 1,60 m e 1,80 m. Mas mais importante que a altura é a capacidade de gerir forças complexas em frações de segundo.


7. Treino Específico para Salto com Vara

a) Técnica

  • Corrida com vara: para familiarizar a postura
  • Saltos parciais: com vara curta e em caixa baixa
  • Simulações com corda ou vara em suspensão

b) Força e potência

  • Pliometria (saltos, rampas, caixas)
  • Treino com pesos (agachamentos, arranques, cleans)
  • Treino de tronco (core)

c) Mobilidade e flexibilidade

  • Ombros, anca e coluna são prioritários
  • Alongamentos activos e exercícios de amplitude articular

d) Trabalho psicológico

  • Visualização do salto
  • Controlo da ansiedade competitiva
  • Desenvolvimento de rotinas técnicas e mentais

8. Lesões Comuns

Dada a complexidade e intensidade da prova, o salto com vara está sujeito a lesões, especialmente em atletas iniciantes ou mal preparados.

Lesões mais comuns:

  • Luxações de ombro
  • Tendinites nos punhos e cotovelos
  • Lesões lombares
  • Entorses de tornozelo
  • Lesões por queda descontrolada

A utilização correta do colchão, o acompanhamento técnico e a progressão gradual são fundamentais para prevenir acidentes.


9. Recordes e Atletas Icónicos

Masculino:

  • Recorde Mundial: Armand “Mondo” Duplantis (Suécia) – 6,24 m (2024)
  • Também ultrapassou os 6,00 m mais de 60 vezes — um feito histórico

Feminino:

  • Recorde Mundial: Yelena Isinbayeva (Rússia) – 5,06 m (2009)
  • A primeira mulher a ultrapassar os 5 metros

Outros grandes nomes: Renaud Lavillenie, Sergey Bubka, Katie Moon, Sandi Morris


10. Salto com Vara em Portugal

Portugal tem vindo a crescer nesta disciplina, com destaque para atletas em categorias jovens e séniores.

Destaques nacionais:

  • Emanuel Sousa (sub-20): promissor saltador que tem vindo a melhorar progressivamente
  • Maria Leonor Tavares: participou em diversos Campeonatos Europeus e Mundiais, alcançando marcas acima dos 4,40 m
  • Marta Onofre: recordista nacional feminina, presença assídua em competições internacionais

O apoio técnico da Federação Portuguesa de Atletismo e o investimento de clubes como o Sporting CP e SL Benfica têm permitido consolidar a disciplina em solo nacional.


11. Curiosidades

  • Sergey Bubka quebrou o recorde mundial 35 vezes (17 indoor, 18 outdoor)
  • O salto com vara é das poucas disciplinas com variações de material altamente personalizadas
  • Alguns atletas possuem coleções com mais de 20 varas, adaptadas a diferentes condições de vento e competição
  • A vara não pode ser usada para impulsionar com as mãos — serve apenas como alavanca mecânica

Conclusão

O salto com vara é uma prova única no atletismo — talvez a mais exigente em termos técnicos e mentais. Envolve a fusão entre velocidade, força e precisão num salto que parece desafiar a gravidade. Com atletas como Duplantis e Isinbayeva a elevar o nível da disciplina, o futuro promete ainda mais saltos extraordinários.

Em Portugal, a base está lançada para uma nova geração de atletas capazes de voar mais alto. Para quem deseja iniciar-se nesta disciplina, o caminho será exigente, mas recompensador.

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